A experiência do Mestrado


Antes de ingressar no Mestrado, li muito com a ajuda da Biblioteca Florestan Fernandes para compensar a limitada biblioteca da graduação e mandei e-mails para os professores das áreas do meu interesse - tanto da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas como para a Faculdade de Educação. Recebi um retorno positivo de dois professores [Prof. Dr. Leopoldo Waizbort (Sociologia da Arte - FFLCH) e Prof. Dra. Maria da Graça Setton (Sociologia da Cultura e Educação - FE). Optei pela Educação e passei a participar dos encontros do seu grupo de estudo Práticas de socialização.

Depois da seleção (prova de língua inglesa, prova específica de Sociologia da Educação, análise de carta de motivação, análise de curriculum, análise de projeto e entrevista), aprimorei o projeto antes do início das aulas. A existência de um grupo percussivo, Caracaxá, na Praça do Relógio e o fato da filha da orientadora ir ao Recife batucar - assim como algumas amigas de classe média -, deu-me vontade de investigar o que é aprendido, ensinado e trocado nas práticas culturais de maracatu. Ou seja, dediquei-me a pesquisar a educação informal, a educação como cultura, e adquiri como alicerce um intelectual denso, até o momento desconhecido, como Pierre Bourdieu. Projeto definido, leituras bourdieusianas e as primeiras disciplinas.

A primeira foi Dimensão cultural das práticas urbanas, ministrada pelo Prof. Dr. José Guilherme Cantor Magnani. Com uma bibliografia extensa e profunda, entrei em contato com a Antropologia - e senti uma certa diminuição, pela primeira vez, pelo fato de ser nordestino, sem vitimismo. A ideia de regularidade simbólica e suas adjacências foram fundamentais para mim e para a pesquisa. Na sequência, participei da disciplina Religião e Sociedade, ministrada pelo Prof. Dr. Lísias Negrão. Com uma bibliografia tão curta como densa, entrei em contato com as teorias que versam sobre a dinâmica entre a religião e a realidade social. Para finalizar a passagem pela FFLCH, participei também da disciplina Do afro ao brasileiro: religião e cultura nacional, ministrada pelo Prof. Dr. Vagner Gonçalves da Silva. Esta disciplina organizou as duas anteriores e encaixou-se com perfeição à pesquisa. A bibliografia substancial foi indispensável para compreender melhor as dimensões das praticas culturais de maracatu.

(Ser da FE e assistir aula na FFLCH permite-nos enxergar bem as barreiras e os duelos entre os campos acadêmicos. A Sociologia da Educação parece ser o que há de mais inferior - mesmo quando dialoga com a Sociologia da Cultura. Esquece-se que muitos intelectuais das Ciências Sociais passearam pela Educação - por inevitabilidade. Sociologia e Antropologia são dois mundos e o diálogo com a História e demais humanidades nem sempre acontece.)

Na Faculdade de Educação, participei da disciplina Antonio Gramsci: a Educação como Hegemonia, ministrado pela Prof. Dra. Carmen Sylvia Vidigal Moraes. Essa disciplina foi oferecida, coincidentemente, com minha aproximação às discussões acadêmicas e ao movimento estudantil e logo após a greve de 2008. Não só por isso ela foi muito importante para mim e para a pesquisa: como trabalhar com camadas sociais sem versar sobre luta de classes e suas derivações? Além disso, como não ficar encantado com o legado de um intelectual tão intenso como esse italiano? Mesmo sem a aprovação da minha orientadora, conclui a disciplina e fui monitor da sua disciplina Política e Organização da Educação Básica no Brasil (POEB) para futuros pedagogos no semestre seguinte.


Além dessas quatro disciplinas creditadas, assisti durante dois semestres aulas da Prof. Dra. Maria Celeste Mira na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). Ambas tinham a Antropologia e a Sociologia como ponto de partida e as produções e práticas culturais na contemporaneidade, os critérios de legitimidade, o hibridismo cultural, as indústrias culturais e as questões patrimoniais, entre outros temas, como trajetória. Participei por um breve período do seu grupo de estudo Práticas culturais contemporâneas

Ou seja, depois de seis disciplinas e uma pesquisa de campo prévia (um mês), era preciso pensar, escrever e preparar-se para o Exame de Qualificação. Aprovado. Durante todo esse período, caminhei solitário no meio das leituras com poucos encontros com a orientadora (por falta de tempo dela ou por estar fora do país preocupada com sua Livre Docência) - e lecionando na rede particular de São Paulo. Reuniões esporádicas em sua casa, horários descabidos e não-negociados, implicância com a escrita, impaciência. Sem bolsa e com toda essa bagagem para transformar em páginas, encontrei-me frente ao maior desafio da pesquisa: pesquisa de campo, análise dos materiais e elaboração da dissertação. Ainda tentei fazer a disciplina Uma leitura de Pierre Bourdieu, ministrada pela orientadora e desautorizada pela mesma.

Tudo isso tornou-se muito mais difícil pela necessidade de dialogar todo o desafio com um calendário imposto pela orientadora - tendo como prazo final alguns meses antes do prazo final. Realizei a pesquisa de campo (acompanhando a vivência das práticas culturais de maracatu na Nação do Maracatu Porto Rico de dezembro até o final do carnaval de 2009). Anotações, entrevistas, fotografias, filmagens, retratos sociológicos e mais pesquisas. Entretanto, por me sentir sufocado pelas cobranças e sem acompanhamento suficiente, tentei resolver esse mal estar enquanto finalizada a caminhada.

Troquei de orientador três meses antes do prazo final para o depósito da dissertação. Humanamente acolhido pelo Prof. Dr. Afrânio Mendes Catani, da mesma área e com uma leitura mais parecida com a construída por mim sobre os escritos de Pierre Bourdieu, contamos com a presença da Prof. Dra. Carmen Sylvia Vidigal Moraes e o Prof. Dr. Francisco Cabral Dalembert Júnior na defesa e tudo findou da melhor maneira.




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Apresentações de comunicações:
Quando a cultura popular torna-se moeda: as estratégias de apropriação e de conversão da tradição (33º Encontro Anual da ANPOCS).
Para além da periferia: a desterritorialização das práticas culturais de maracatu (II Reunião Equatorial de Antropologia e XI Reunião de Antropólogos do Norte-Nordeste).
Práticas culturais como práticas educativas: o processo de socialização e as trocas simbólicas dos batuqueiros (36º Encontro Nacional do Centro de Estudos Rurais e Urbanos).
Sobre o hibridismo cultural e a socialização contemporânea (III Simpósio Internacional sobre Religiosidade, Diálogos Culturais e Hibridações).
A socialização pelo batuque: reflexões sobre a relação entre uma nação de maracatu recifense e o processo de construção de habitus (I Seminário Latino-Americano de Pós-Graduação em Ciências Sociais).
A diversidade de capital escolar nas práticas culturais da Nação do Maracatu Porto Rico [Recife/PE] (II Seminário Internacional: Escola e Cultura).
A distinção e o terreiro: um estudo sobre as trocas simbólicas e o processo de socialização (35º Encontro Nacional do Centro de Estudos Rurais e Urbanos).

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Ministrei o minicurso Um olhar sobre o Hibridismo Cultural: a tradição em Lenine e o moderno em loas de maracatu, em parceria com André Maranhão, amigo-acadêmico, na VIII Semana de Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo em 2009.

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Foi uma experiência rica e um pouco traumática. A faculdade tem uma infraestrutura considerável, a biblioteca é vasta, os professores são bem qualificados e exigentes - mas nem todos são didáticos -, a produção acadêmica é ampla e diversificada, os recursos existem. É, de fato, uma das melhores universidades do Brasil - e o Programa de Pós-Graduação em Educação um dos com melhor avaliados em nível nacional -, mas existe um elitismo sem igual. É preciso aprender a jogar e jogar com firmeza e sabedoria.

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O conteúdo da dissertação, sintetizado, encontra-se disponível ao lado esquerdo deste blog.